28.7.14
O SORRISO DO TATU
Disse-lhe o professor, naquele dia memorável:
"A realidade é mais complexa que o bem e o mal. Você estuda quarenta anos para começar a entender alguma coisa".
Sim, foi quando ele voltou para a casa de chão batido de sua avó. Na panela, ela cozinhava o tatu. No chão, pelado, o seu irmão mais novo, seis meses de idade, chorava.
- Que ele tá chorando, vó?
- Eu botei o tatu pá cozinhá. Tatu amigo dele.
Silenciou-se, vez que jamais recriminaria sua vó por cozinhar um tatu incauto que desse sopa por ali. Sopa de tatu era a especialidade da velha.
- Tó o dinheiro, vó - e estendeu a mão com vinte reais. Ela pegou e escondeu rapidamente sob o vestido. Ele olhou a velha e quis chorar, mas a vó não gostava de homem chorando. O nenê já não chorava mais. Nem sabia que seu amigo estava na panela. Nenês se adaptam facilmente. Foi o que comeu com mais vontade a sopa de tatu com farinha velha.
Mas a fome do bebê não saciava. Logo chorou de novo. Havia de ser lombriga.
E lembrou-se do colega do colégio que inventou um deus que só comia mato e defendia a natureza e não comia tatu. Devia ser o deus dos que nunca sentiram fome. Que até o deus índio da sua vó adorava uma capivara.
A criança continuava chorando. Sobre a mesa, todos comiam, um pequeno pedacinho de carne para cada um. À porta da casa, vislumbrou a curiosa cabeça de outro tatu, enxerida. O tatu, parece que sorria.
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