25.8.16

A MORTE DO AMIGO NÃO FOI O AMIGO NEM FOI MORTE, MAS EU GOSTO DELE


Sim, ele foi traído, e quem não foi? Ora, é consabido que a verdade ele procurou, e a verdade é o caminho mais estreito e não é pavimentado e é cheio de carrapatos que exigem uma parada para que sejam arrancados à unha, vez que até os instrumentos de arrancar carrapatos nos tiram e nos tiram até os carrapatos.

Ora, amigo, sequer amigo você é, mas cá conosco, somos amigos, e você está no Canadá. Tiram-te o ar colocando o dedo na traqueotomia e você entra em pânico, como o afogado que balança os braços de forma anárquica ao invés de dar um potente soco de direita na têmpora do maldito.

Sim, eu me afogo nos vapores da fumaça, e vou parar no Mandaqui, que facilmente renderia um soneto rimado no Juquiri em que eu receberia uma carta enviada por mim mesmo que jamais seria aberta, por quê? Porque ali talvez habitem meus sonhos alucinados.

Mas meus sonhos são apenas sonhos meus, e deles desvencilhado talvez me sobre mais tempo para a verdade, e eu gostei do que você fez com o filósofo, e gostei do filósofo, e gostei da dialética e da esposa e filhos e de estar acordado para dormir certificando-me de que estivessem cobertos.

Somos belos, embora nem sempre estejamos bonitos na foto.

O importante é o que importa. Enquanto escrevo, o louco grita na rua. Já estive lá.

(IMAGEM: DANIEL ARAGÃO)


13.8.16

CONFIANDO EM SI




Não confie demais em si.
Esqueceu o dó-ré-mi?
Não confie nos seguidores, confie nas dores.
Sem conclusões, oclusões nas artérias
São mais reais.
Animais.
Quando as palavras não fazem mais sentido converso com o cachorro e o gato.
E leio Paulo Leminski
E estudo Paulo Freire,
Freire me lembra frieira, não freira,
E coça,
Não faça troça.
Ironia
Mama mia
Funiculì, funiculà
Funiculì, funiculà
'Ncoppa jammo ja'
Funiculí funiculá
Giuseppe Peppinno! O bonde está chegando!
O bonde ainda tem sentido,
Mas não existem mais
O sentido, a rima e o bonde.

2.8.16

GENTE NORMAL

O apito do guarda noturno lembra o uivar do lobo. Olhei para o lado esperando achar peiote. Apenas a luz havia sido extinta, no momento. As televisões e as internets se calaram. Então, com o silêncio dos aparelhos eletrônicos, pude ouvir as preces ao governo, vindas de todo o bairro, para que restabelecesse a energia. As preces vinham desde a novela interrompida até a máquina de hemodiálise desligada.

 Eu quis ser Aliocha, mas nada neste mundo permitia. Fogos de artifício começaram a estourar em homenagem a algum time de futebol. Esses torcedores que consigam alguém para enfiar essas bandeiras de time de cem metros dentro das suas gargantas, arrastando o que sobrar em seu féretro.

 Com o barulho dos fogos, gente muito sensível começou a se preocupar com os coitadinhos dos cachorrinhos, e eu me coloquei em posição fetal e passei a chupar o dedo.

 Levaram-me ao hospital, onde me aplicaram pesadas injeções de narcóticos até que eu assumisse ser um cabra macho torcedor do corinthians e amante dos bichinhos, como toda a gente normal.

 Certamente toda essa gente é muito racional.


 Poderia dizer que são os jovens, mas os jovens acham os zumbis e os vampiros menos bizarros.