20.10.18

O JARDIM DE VOLTGAARD

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Chorou, sim, mas as lágrimas eram menos volumosas que outrora.

Já não estava no bar, mas no banco daquela sua praça especial, diante das mesmas estátuas de figuras esquecidas que as pombas indolentes e cínicas brindavam com suas cloacas, lixo espalhado pelo chão de terra batida; onde deveria haver grama, grama não crescia.

Pensava nela e nela e nela e no que ela havia sido. E de si mesmo já tinha um veredito, nada favorável. Um grande covarde, talvez, ou apenas uma natureza sensível, para usarmos aqui um eufemismo, mas nada indulgente para consigo.

Chutou o copo plástico de iogurte, porque os catadores nunca deixavam uma lata para ser chutada. As latas eram valiosas. O resto do lixo estava todo lá .

Perdoar, perdoar, perdoar, poderia perdoar, mas viver aquela vida? Não sobreviveria a ela.

Amar, amar, poderia amar e amava, com todo o pacote de que humano não me é estranho que possa haver nesta vida.

Ela, a mulher, não mudaria. Mas ele já não era o mesmo. Ela não conhecia outra vida que não aquele hedonismo piegas e superficial, e não fazia questão sequer de lutar contra o vício: gostava do vício, se orgulhava dele, como se fosse algo rebelde e vanguardista, na verdade ele suspeitava que ela não fazia sequer ideia de outra vida possível, e ela era apenas patética. Ambos o eram, com a única diferença de que ele o sabia.

Já não conseguia manter o ar suspenso no peito para um mergulho tão profundo nesse desafio, não cria ter competência de ajudá-la, com todos os demônios que já o espreitavam. E ela não ligava para isso, as coisas iam ser do seu jeito, ainda com funestas consequências.

Ainda assim a amava; porém a redenção é individual. Definitivamente, ela não era Sônia. Talvez não conhecesse o amor.

Ele talvez conhecesse o amor, e sua fraqueza o chutava como um copo plástico de iogurte.

Estreito e solitário é o caminho.

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