23.11.14

MEIA NOITE: PARIS E O PÉ QUEBRADO


Os escritores são cheios de palavras, diz-me o filme de Woody Allen, "Meia noite em Paris".  Sobre o filme, a única coisa com que concordo é que Paris é uma cidade brega. Tudo bem, eu também sou brega. Sou cheio de palavras, sou cheio de bitucas de cigarro, de latas vazias de cerveja e agora tenho também um pé quebrado. Odeio as mulheres, embora as ame. Carrego minha Paris particular comigo e sempre grito em meio à madrugada, até o vizinho me xingar.

Picasso e Hemingway. Scott e Zelda. Desencaminhado pelos anos vinte, procuro reequilibrar a idiotia lendo Agostinho, Aristóteles e Tomás de Aquino. Eu fracasso.

Meu pé quebrado não dói. Quebrei-o chutando a cadeira. Quebrei-o porque há uma mulher. Sem mulher, não haveria pé quebrado. Prefiro-o assim.

Amo as mulheres, fingindo odiar. Todo o movimento do homem é o medo da mulher.

Paris não dói. O pé também não.

E eu amo a mulher.

20.11.14

O GRANDE NINGUÉM E A SOLIDÃO DAS ESFERAS



Hoje é o dia da consciência de alguém. Eu não sou alguém cuja consciência tenha dia. Embora hoje não seja o dia da minha consciência, ela se recusa a espairecer, irrefletida.

Enquanto reflito sobre o que seja a tal da consciência, se ela está na pele ou na mente, ouço o Tucuruvi tremer.

Um dia serei um escritor sem estilo, por enquanto sou apenas o Grande Ninguém, que caminha para lugar nenhum. Sim, creio que transcenderei.

Mas não é sobre isso que vou contar, porque o Tucuruvi está tremendo, e o Tucuruvi hoje é a casa do Grande Ninguém, que às vezes é chamado Grande Nada. Esse ruído, que penetra os sentidos, faz-me despertar de pensamentos, que refletem sobre a consciência, para chegar à janela, não como o poeta que lá vê o cego e a guitarra, mas como curioso por desvendar o ruído que se aproximava.

Fiquei como o cego, sem ver, mas outros sentidos me informaram: é um helicóptero.

Parecia que explodiria dentro de casa, e uma vez que eu tinha uma casa e gostava muito dela, temi mais pela casa que na verdade era alugada.

Não explodiu, passou. O helicóptero se foi, ruidosamente como a velha cigana ia, eu me lembro, a cigana que era mãe dos comunistas, e na sequência do helicóptero, os aviões passaram a taxiar pelo Tucuruvi e eu me pus a não esquecer do assunto e a teorizar (pois que tenho muita prática na teoria) sobre as motivações de cada um desses homens que deslizavam sobre a minha cabeça em máquinas de levar homens do nada a lugar nenhum, igualando sem revolução o destino dos que estão no solo ao dos que deste se elevam, de forma precária, para nele finalmente se aconchegarem no aconchego eterno, transcendendo ao pó.

Sei que parece complicado, mas faz sentido, e protesto por usar o sentido, pois há vários caminhos para o lugar-nenhum, e ninguém pode usar de inocência para negar: aqui, importam os meios.

O helicóptero (e seu homem, o piloto) poderia estar fazendo um transporte de urgência de algum acidentado, levando drogas ou dinheiro da máfia de Caracas, poderia estar com pressa para semear ou ceifar.

Que importava? No ar, o piloto é escravo da máquina.

Importava a solidão e  perfeição das esferas.

5.11.14

CINGAPURA. NÃO.


"Para quem não vive sem uma goma de mascar e acha que pode 'driblar' a lei e jogar o chiclete no chão, câmeras de vigilância 'entregam' os infratores à polícia. São praticamente duas a cada cem metros, espalhadas por postes, sinais de trânsito e fachadas de lojas. 'Não há privacidade em Cingapura, esse é o lado ruim daqui. No entanto, a cidade é limpa, não há sujeira, violência ou pobreza', lembra Robbie Ho. Outro hábito comum no Brasil e que pode literalmente custar caro em Cingapura é o de fumar. Na verdade, não há problema em dar tragadas em público. O problema é oferecer um cigarro a um colega. 'As pessoas podem te pedir cigarros, mas jamais ofereça. Se for pego, você terá de pagar US$ 200 (cerca de R$ 320) em multa', diz o motorista, que dirige um luxuoso carro com um bibelô de Buda, adornado com uma pena de pavão no painel. 'É para oferecer harmonia aos passageiros que transporto.'"

Fechou o laptop, em que lia as notícias do portal da terra. Estava saturado de notícias. Não sem lembrar que 'não há privacidade em Cingapura'. Não tinha o hábito de mascar chiclete e jamais oferecera cigarros a ninguém, no Brasil mesmo. Discou, digitando os números, para o agente que o convidara a trabalhar em Cingapura, para recusar o convite.

Não tinha medo de ser preso.

O problema era a privacidade.

Lembrou-se de Orwell. Arrepiou-se.

Cingapura, não.

O PLANETA DO GRANDE NINGUÉM É MENOR QUE O DO PEQUENO PRÍNCIPE

4.11.14

ACERCA DA FOTO TIRADA PELA NASA

Foto do Brasil tirada pela Nasa! Sensacional!!! Não acham?


É realmente lindo. Imagino que talvez os filósofos como Leibniz pudessem chama-lo o melhor dos mundos, enquanto Voltaire arrotaria seu Cândido. Não obstante, solitário como de minha índole, pergunto: quem mais contribuiu para essas luzinhas estarem acesas: Leibniz ou Voltaire?

Tendo a crer que seja o melhor (dos mundos), colocando uma impressão de que melhor mundo não possa haver, visto que não conheço um mundo melhor que este; entrementes, o fato de desconhecer outros mundos não quer dizer que não existam. Mas, nesta terra e nesta vida, definitivamente, não existem.

Porque esta vida eu conheço, embora tenha me negado a conhece-la. Não adianta. Ela se me adianta e está sempre pronta a me esbofetear com verdades.

E se eu olho para os céus, e vejo neles a divina providência, não é para Marte que eu esteja olhando. Embora esteja olhando para Marte.

Leibniz era bem feio. Mas ele descreveu o primeiro sistema de numeração binário moderno, tal como o sistema numérico binário utilizado nos dias de hoje.

Talvez Leibniz seja o pai do Google. Talvez não. Certo é que o Google vai acabar, um dia. O dígito binário, não. Como baratas.

Já Voltaire é o pai do Cândido. Isso é inegável. No entanto, não ajuda muito.